Contei. O garoto já sabe quinze palavras, talvez mais. Para que
elas lhe servem? Mamã, papá, aua.
Elas o põem em contato com o mundo, com as coisas.
Sempre gostei e me impressionei com as palavras. Impressionei-as,
igualmente, com o meu ritmo frenético, tentando mais amá-las do que sabê-las.
Que fiz eu delas, que fizeram elas de mim?
Ele já sabe quinze palavras, talvez mais. Eu o observo e ao seu
dicionário inconcluso. Aproximam-nos as poucas palavras que trocamos, em
silêncio. Elas lhe proporcionam coisas, saciam-no. A mim, a combinação delas
leva ao êxtase, traz-me de volta o gosto doce da vida. Impagável! São apenas
palavras, mas escrevê-las e lê-las em seguida é o supremo elixir, faz renascer
o menino que eu fui e que, como ele, dizia aua
quando tinha sede e lia livros para não morrer. Sempre me fartei de
palavras e vivi, confesso, saciado. Não há vazio em mim que elas não preecham;
elas cobrem-me a calvície como um véu.
Mas, afinal, era para falar dele ou de mim que eu dei a escrever?
De mim ou do bebê que já sabe quinze palavras, ou mais, e com elas vive como se
– tal qual acontece comigo – nada lhe faltasse?
Agora sei muitas palavras. E o que fazer com elas, senão molhá-las
no leite e comê-las como pão? Escrevi-as tantas, mas o silêncio ainda reina em
mim e me ronda como rapina. Escrevê-las e lê-las em seguida, por enquanto,
basta-me.
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