Remexendo o Passado- Jugurta de Carvalho Lisboa



    O ser humano, como quase todo animal, traz na massa do sangue a tendência que o caracteriza como um ser gregário. Eu me incluo neste contexto. Sinto que não nasci para ser ilha. No meu dia-a-dia, uma das coisas que me dão prazer é o relacionamento com a família e com pessoas, de modo geral. Com o advento da Internet, então, eu tenho me dedicado ao reencontro de amigos distantes, não só pelo passar dos anos, como pelas distâncias geográficas. Outra oportunidade que esse veículo de comunicação nos permite é ampliar nosso rol de contatos virtuais e isto tem acontecido comigo. Através de e-mails e redes sociais, não só ampliei meu grupo de amigos, como tenho batido papo, em tempo real, com familiares e conhecidos, tanto dentro do país, como no exterior.
    Acabo de soprar minha octogésima velinha; portanto, sou um legítimo representante da terceira idade. Felizmente meus neurônios ainda permitem que eu me lembre de fatos, pessoas, lugares e tantas outras coisas, aparentemente, perdidas no tempo. Como exemplo disso, quero relatar o fato que segue. Tenho um tio afim, que reside há muitos anos no extremo sul do país. Enviou-me um e-mail, contendo um trabalho maravilhoso intitulado “Jamelão e a Orquestra Tabajara”, onde em uma série de discos girantes, aparece o nome da música em cada um; para ouvi-la basta clicar no disco escolhido.
    Para mim, foi uma agradável viagem no tempo. Ouvi todas as músicas. Jamelão e a Tabajara, quanta saudade! Voltei à Década de 50. Eu, ainda jovem, jamais perdi os programas que a Rádio Mayrink Veiga apresentava todos os domingos entre doze e treze horas. Estivesse eu, onde quer que fosse, aquele horário era sagrado. Chegava em casa, ligava o rádio e toda minha atenção era voltada para aquele momento musical.
    O programa iniciava com a Orquestra executando o prefixo costumeiro, destacando o solo de Severino Araújo ao clarinete. Daí em diante, o repertório selecionado para o dia, tendo à frente, aquele monstro sagrado, com sua voz metálica e característica, na interpretação do iluminado e saudoso Jamelão. A emoção era incontida.
    Os anos se passaram. Agora, entre a década de setenta e o ano dois mil. Eu, morando no Rio de Janeiro. O que eu antes ouvia pelo rádio, passei a assistir ao vivo. Quanta lembrança dos programas Seis e Meia, todas as sextas-feiras no Teatro João Caetano, na Praça Tiradentes! Durante a longa temporada, assisti a quase todos. Vi a Orquestra tocar em vários locais, entre eles, no Parque da Catacumba, na Lagoa Rodrigo de Freitas, onde a Tabajara fez várias apresentações. O local, todo gramado e ecologicamente preservado era a céu aberto. Principalmente ali, tive a oportunidade de conversar com vários músicos da grande Orquestra; entre os quais, Manuelzinho Araújo (trombone) Plínio (bateria), Jaime (sax-alto), Santos (trompete) e outros tantos.
    Quanto ao Jamelão, falei com ele algumas vezes. O último abraço que lhe dei, foi por ocasião de uma homenagem que recebera pela comemoração de seus oitenta e um anos, no Country Club de Jacarepaguá, a cem metros de onde eu morava. A sua presença naquele local, atraiu um grande número de pessoas, na maioria, da terceira idade, que compareceram para participar das homenagens. Uma das coisas que me chamou a atenção e até meio bizarra, foi a quantidade de pastel que ele comeu. Ele, não só demonstrou sua predileção por aquele tipo de salgadinho, como uma grande vitalidade, durante todo o tempo em que permaneceu naquele local, ouvindo os vários discursos em sua homenagem, como soltando sua voz inconfundível, acompanhado por alguns componentes da Verde e Rosa.
    Com essas lembranças, deixo aqui as pegadas do meu saudosismo e meu tributo à Orquestra Tabajara, na pessoa do seu grande líder, Severino Araújo, bem como ao imortalcrooner e o maior puxador de samba de todos os tempos, sua majestade, JAMELÃO.






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