"Por
detrás das cortinas, seguia-te com o olhar, até que desaparecias no fim da rua,
e este prazer, rápido como era, alimentava o meu amor, habituado a viver de tão
pouco.” (José de Alencar)
Padecia
de amor. Carecia de cuidados que os pais, a bem da verdade, nunca deixaram de
dar. O pai, gerente de uma metalúrgica famosa, afrouxava a gravata e maldizia o
genro esquivo, jurava morte ao patife, mas jurava baixo, pra sua pequena não
ouvir. A filhamantinha com o rapaz um relacionamento praticamente unilateral,
mas seu comprometimento, de grande que era, valia para os dois.
O
mancebo, em longa viagem, aumentou involuntariamente sua indiferença e a moça
foi caindo doente: não comia, e, por tabela e por escolha, em poucos dias
também já não saía da cama. Em vigí-lia, aprendera a reconhecer as palmas
sonoras do carteiro que, diari-amente, trazia as correspondências e as lançava
portão adentro.
Cambaleante,
levantava da cama num pulo só, ralhava com a empregada, tropeçava na mãe e
chegava às cartas primeiro. No al-pendre, caçava com os olhos os telegramas que
seriam do amado. Seriam, mas não eram.
Mais
uma vez, voltava ao quarto para encerrar-se numa escuridão consciente e atenta.
Passavadas quinze horas de uma quarta-feira abafada e claustrofóbica, quando,
inebriada pelo mormaço, caíra sobre o negro assoalho da desdita.
No
dia seguinte, sob palmas desavisadas, o carteiro bradava por atenção. A carta
do amado enfim chegava, mas ninguém podia recebê-la, por ocasião do velório.
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