1961: A Inauguração da Fonte Luminosa- Augusto Aguiar




                No final da tarde de 30 de dezembro de 1961, data da inauguração da Fonte Sonora e Luminosa Gazeta de Bebedouro, a Fonte Luminosa, a cidade ficou sem energia elétrica. O fato gerou ansiedade e as pessoas se perguntavam: “E a inauguração da Fonte?”.  Para alívio geral, a energia elétrica foi restabelecida menos de uma hora depois. Os semblantes, então, ficaram aliviados.
                Dia oficial do banho, o sábado coincidiu com a data do evento. Talvez, por isso, a adesão àquele  componente da higiene pessoal teria sido maior do que a quantidade de quilowatts disponíveis. Assim sendo, nesse dia, o banho de assento não teve uma boa audiência. Em consequência, devido à sobrecarga, a rede de energia elétrica entregou os pontos.
                Ironizar a questão do banho era comum na época. Quer isso dizer que  a semântica aqui empregada a respeito dele não é deboche, apenas resgata um costume de brincar com as pessoas que levavam esse item da higiene pessoal em banho-maria. Ou seja, prolongavam um pouco a data entre um banho e outro.
                A noite chega e o momento da inauguração também. De repente, no sentido vertical e com uma boa vazão,  jatos de água  coloridos, contínuos e compridos rasgam o ar. Houve um coro de exclamações de espanto e admiração que ainda ressoa na memória de muitos dos presentes.
                Nos anos 60s, alguns bebedourenses foram ganhar a vida na América do Norte. Afonsinho Cabeleireiro, seu irmão Mazzaropi, entre outros. Um senhor que levava brasileiros para trabalharem nos Estados Unidos assistia à inauguração com a família. Uma adolescente americana os acompanhava.
-Rain Curtain. – ela exclamou . Em seu idioma significa: “Cortina de Chuva”.
                O que aconteceu? Provavelmente, os jatos de água da Fonte contêm em suas partes superiores - as cristas -  gotas de água menores do que as da base; sendo assim, ficam menos resistentes ao vento. Este as empurra com facilidade  e com isso surge uma espécie de  cortina de água semelhante à névoa ou ao chuvisco. 
                Os jatos molharam de leve o público que estava na área para a qual a cortina de água pendeu. Por isso, houve um segundo coro de exclamação de espanto – nenhum de admiração – emitido pelas pessoas aspergidas pela água. Naquele momento, quem tomou e quem não tomou banho antes de ir para a inauguração experimentou um exemplar banho de gato.
                Com um estilo arquitetônico arrojado para a época - sua geometria é de  um polígono estrelado - a Fonte Luminosa localiza-se à Praça Barão do Rio Branco. Integra-se a ela como seu elemento fundamental, apesar de compartilhar espaço com outros destaques,  o tamarindeiro e a Concha Acústica. Dependendo do ângulo, a igreja Matriz faz parte desse belo conjunto visual. No entanto, sua localização é na Praça Monsenhor Aristides. Ambas são separadas pelo que seria a Rua Prudente de Morais, caso não houvesse as praças.
                Além disso, emerge a arquitetura de conteúdo sentimental, aquela do tempo psicológico. Trata-se da sucessão de estados internos de uma pessoa. Isso ocorre com gerações e gerações que atravessaram o tempo de existência da nossa musa, a Fonte. São, portanto, recordações inapagáveis no espaço entre a Fonte Luminosa e alguma coisa dentro de cada um.
                A realidade exige a presença. Como a realidade ficou para trás, a sensação é de algo como se fosse uma folha de caderno arrancada, amassada e jogada fora, mas que voltasse a fazer parte dele  como se nada tivesse acontecido.  Cenas inesquecíveis  escondidas no fundo de nossas memórias reaparecem... Ora se expandem, ora se encolhem retratando fatos que aconteciam: sem dia, sem horário e, às vezes, sem roupa.
                Num dia calmo, vivencie um momento de contemplação: fique a sós com a Fonte Luminosa. Talvez você se lamente pelas grades fincadas ao redor dela. Tantas recordações e tantas projeções agora estão prisioneiras.  Mas, num diálogo de silêncio, a Fonte dirá:
                - As grades preservam suas lembranças e anseios; sem essa proteção, eu quase não existiria mais. 
                Apesar de sonora, fala baixinho. Ali tão perto, a Concha Acústica não pode ouvir nem escutar a conversa. Senão, entra em pânico. Ela não tem grades.

Texto registrado na Agência Brasileira do ISBN (International Standard Book Number) Ministério da Cultura - Fundação Biblioteca Nacional, sob número 978-85-63853-54-7. 






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