As Alegrias da Terceira Idade- Jugurta de Carvalho Lisboa

     
    A complexidade do comportamento do ser humano está fora do alcance do nosso entendimento. Dentro desse contexto, não existe nenhum manual ou código para ditar a maneira exata de como cada um deve comportar-se ao longo da vida. A partir do momento em que nascemos, as diferenças já se tornam evidentes. Poderíamos debitar essas desigualdades à carga genética que cada um já traz consigo.
    A maneira de ser e agir é compatível com o momento de vida, dentro das várias fases, como sejam: criança, adolescência, juventude, fase adulta e velhice. A validade desta afirmativa está condicionada aos limites impostos pelas condições físicas e mentais de cada indivíduo.
    Isto posto, quero focalizar a última fase, que os mais otimistas chamam de “a melhor idade”. É nesta, que dentro das minhas oitenta primaveras e de meu olhar otimista, pretendo inserir-me.
    Isento da pretensão de submeter o leitor a conceitos de autoajuda e, muito menos, de aviar receitas para a cura de tédio, melancolia, depressão e outros males que perseguem os anciãos, quero desnudar alguns segredos, capazes de evitar que eles sintam na condição de “pior idade”.
    Na vida, tudo é efêmero, inclusive a própria vida. Pertinente a esta afirmação, a sabedoria popular criou o adágio, que diz “não há bem que sempre dure e nem mal que nunca acabe”.Faço deste princípio a pedra angular que sustenta o meu equilíbrio diante dos desafios diários.
    Meu lema é sorrir. Sorrio para o renascer de cada dia; para o entardecer; para o pôr-do-sol; para o silêncio da madrugada, enfim, sorrio para a vida. Jamais sorrirei para a desgraça alheia, mas chego a violar os limites do bom senso e sorrir para a própria desgraça. Sado masoquista? Jamais. Este é um sorriso sarcástico para mostrar que sou superior à desgraça. Penso que sou capaz de receber a visita da Indesejada das Gentes, com o maior sorriso.
    Há dias, fui até a Unimed para encerrar uma das vias sacras que faço periodicamente. Retirei minha senha e sentei-me para aguardar o atendimento. A sala estava repleta. Na maioria, velhos. A seriedade e a denotada preocupação era o que se via em cada face, em cada olhar.
    Chegada a minha vez, levantei-me e após apoiar-me com a mão sobre o encosto da cadeira para garantir o equilíbrio, caminhei até o guichê, onde correspondi ao sorriso simpático da atendente. Entreguei-lhe a guia com uma vasta lista de exames solicitados pelo meu cardiologista, para a devida aprovação. Concluídos os procedimentos, eu a fitei nos olhos e com o meu sorriso meio irreverente, disse-lhe que naquele momento eu estava sentindo o sabor da glória de ter cumprido um dos roteiros de atividades que mais me fascinam e me fazem feliz.
    Percebendo que ela não tinha entendido bem o porquê da minha confissão, fui logo esclarecendo: Com a devida antecedência, estabeleci a logística e saí de casa bem cedo. Fui a dois médicos, em seguida a várias farmácias para que encontrasse a vasta lista de medicamentos, fui ao fisioterapeuta para as massagens que aliviam minhas dores devido ao meu bico de papagaio, passei na ótica para apanhar os novos óculos que terei que usar após minha cirurgia de catarata nos dois olhos e, finalmente, aqui diante desta simpática atendente.
    Quer felicidade maior que esta? Cumprir um roteiro como este em um só dia, para um octogenário é a própria glória!
                    

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