Lucimar e os Feijões- Carla Barizza



    Feijões são muito misteriosos, pensava Lucimar, nunca sabemos o que eles vão virar depois de cozidos, uns ficam duros, alguns ficam descascados e outros, simplesmente, se desmancham num creme espesso. 
    Lucimar sonhava em ser cozinheira profissional, fazia delícias saborosas e era muito elogiada por todos os parentes e amigos. Arroz soltinho, arroz à grega, arroz com amêndoas, arroz com lentilhas, quibe cru, quibe assado, quibe recheado, massas de todos os tipos, tortas diversas, carnes suculentas e douradas, doces e bolos inesquecíveis. Mas o maldito feijão, aquela praga misteriosa, ela não conseguia acertar. Trocou de panela de pressão, trocou de fogão, trocou de marca, de tempero, assistiu tutoriais no youtube, consultou sites culinários na internet. Nada adiantou. Odiava aquele legume mais do que o diabo. Para ela feijão era o próprio diabo, sempre prejudicando sua vida, impedindo de ter sorte e realização profissional.
    Todos sabiam de sua inabilidade para lidar com aquele legume preferido na mesa dos brasileiros. Elogiavam muito Lucimar, mas sempre com a ressalva dos comentários, as vezes sussurrados: “Lucimar é perfeita, mas o feijão dela, coitada!”, as vezes declarados: “Lucimar que delícia de almoço! Mas seu feijão poderia ser mais macio… menos duro… desmanchou é?”
    Feijão, feijão, feijão, feijão… aquela palavra sempre martelando em sua cabeça. Um dia, depois de cozinhar uma nova marca de feijão que prometia na grande placa de propaganda do supermercado nunca dar errado, e ao abrir a panela verificar ele tinha virado purê, Lucimar agarrou de supetão sua faca de carne e saiu correndo desembestada, de chinelos, touca na cabeça e avental na cintura, em direção ao supermercado, direto para onde estavam os cartazes daquela propaganda enganosa, junto a pilha de sacos daquele feijão farsante e esfaqueou todos os cartazes ardilosos, em seguida foi furando as embalagens fajutas daquele feijão desgraçado, empilhado naquele monte malévolo.
    Todos olhavam assustados para aquela cozinheira maluca e descontrolada que destruía todos os sacos de feijão, sem entender o porquê de sua atitude desenfreada. Os seguranças, com receio de levar uma facada, gritaram em sua direção e, quando Lucimar parou e olhou para todos os presentes, enxergava apenas feijões: cabeças de feijão, corpos de feijão, cabelos de feijão, e avançou freneticamente em direção à eles, esfaqueando algumas pessoas-feijões, quando, enfim, foi contida e desarmada por um segurança corajoso. Foi presa, claro! E na cadeia aprendeu com Adelaide, condenada por tráfico de drogas, os segredos para cozinhar qualquer feijão. Virou a melhor cozinheira que a penitenciária já teve, e é considerada por todas as presidiárias uma super profissional da gastronomia carcerária. Enfim conseguiu realizar seu sonho profissional de perfeição culinária e domar aquele diabo!  


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