VAZANTEIRO- Agenor Filho

     Dono deste chão com sua infinita beleza caminha o vazanteiro com seus passos largos. 
Cultiva, com suas mãos, nossa terra e tira dela o sustento para nossa mesa. A vazante é um pequeno riacho, que desagua do Velho Chico, águas que dão vida e sabor aos cultivos desta terra. 
    O vazanteiro é o dono desse chão! A alma sertaneja revela nesse homem sorriso tímido e fala ingênua, olhar desconfiado, pele queimada pelo sol, misturada com a cor barrenta da nossa terra. 
    Houve um tempo, em que os vazanteiros desciam rio abaixo com suas canoas cheias de produtos da lavoura, vendiam e abasteciam o comercio local, gerando renda e trabalho para essa gente. 
    A esperança do vazanteiro está em cultivar sua própria terra e crescer com suas plantações. 
    Ele acredita na sua força bruta em lidar com a terra, cultura que aprendeu com os pais com o trabalho duro na roça. Um povo resiliente, que enfrenta os caprichos das devastações da seca e em época de chuva, às fortes enchentes. Mesmo com as dificuldades, ainda tem esperança de tirar proveito do solo fértil das vazantes e que, ao pé de suas habitações, emergirão roças de milho, melancias, abóboras, quiabos e feijão.     Do próprio cultivo preparam a farinha de mandioca, o peixe, a carne de porco, galinha caipira, são suas criações. A família é numerosa. 
    Com a esperança pintada nos olhos e o brilho do sol estampado na pele, o vazanteiro carrega a hospitalidade do povo mineiro por ser símbolo dessa terra.


Crônica de Agenor Filho, em destaque, na página 19 da 
Revista Ponto & Vírgula (janeiro/fevereiro/março/2023)


    *Assim como outros povos e comunidades tradicionais, os vazanteiros possuem um modo de vida próprio. São chamados assim porque praticam uma agricultura que está associada aos ciclos dos rios. No Cerrado, eles estão localizados, principalmente, às margens do Rio São Francisco e seus afluentes. 
    O ciclo natural do rio – seca, enchente, cheia e vazante – sempre possibilitou a esses povos, que têm forte influência indígena, qui-lombola e ribeirinha, o acesso à terra periodicamente fertilizadas pela matéria orgânica depositada em longas extensões das margens e ilhas.
    As terras baixas, chamados de baixões, são os locais onde a terra é mais fértil e úmida. É lá que eles vivem e cultivam legumes, ver-duras, frutas e pasto. Além disso, as vazantes e os brejos, com seus buritizais e babaçuais, garantem o sustento dos extrativistas, que também compõem essas comunidades.
    Mas, a construção de reservatórios para usinas hidrelétricas ao longo da bacia do “Velho Chico” vem, sistematicamente, reduzindo e destruindo as áreas vazantes, causando profundas alterações na organização e no modo de vida desse povo.

Fonte: https://redecerrado.org.br/comunidades_cerrado/vazanteiros/


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