FELIZ - Arthur Gregório Valério

 Sê feliz pois da vida não se leva os dias nem as lágrimas. 
Sê feliz pois toda amarga lua a terra devorará junto aos ossos teus, e meus, e porque tão tola quanto a alegria é a tristeza. 
Sê feliz, mas quando puderes, somente quando puderes, e quando não puderes, que te baste o fardo de não seres feliz.
Sê feliz e que te seja fácil a felicidade, pois o prazer é fácil para o coração que é simples. 
Sê feliz, de fato, mas não o tempo todo, não todos os dias da tua travessia. 
As pontes do tempo perpassam abismos e valas e ruínas, mas não será porque o percurso é inevitável que não poderás tocar a alegria nos escombros do teu pranto, para aquele tipo raro em que a felicidade brota e vigora, isso também será degustado como se degusta o vinho que é amargo e doce junto ao pão. 
Sê feliz, mas não porque isso te é necessário, a felicidade é para os pequenos e os grandes, para os bons e os maus, para os que tem no sofrimento os membros dormentes e lavados no sangue, e para os que gozam do alívio sem o merecer,  mas saibas que se fores bom, serás feliz sem que careças de algo além da tua bondade saibas, portanto, que a verdadeira alegria, o sumo bem que anseias está junto da morte e da vida do que tens, mas também mora na sensualidade de tudo o que é possível e não do impossível.
Se ides rezar ao teu Deus, não peças diretamente a felicidade, mas a tolerância, não peças o prazer antes da paciência, pois não existe uma chegada sem um caminho longo e tortuoso. 
Por fim, sê feliz, pois o tempo é breve, porque ainda há tempo e também porque não há mais tempo, porque a alegria te é fácil se quiseres, quando olhares melhor para as pedras e as flores do caminho. 
Portanto: sê feliz, sê feliz pois não tem a razão mais razão do que o teu vão e escuro amor.

SINTO

Sinto pena em minhas faces pálidas 
Em meu olhar lilás, e no tal mistério 
Sinto pena amarga dessa gente    
Que morre por um belo mundo aéreo 
Sinto pena das pedras que não veem 
Sinto pena dos andarilhos sorridentes 
Sinto pena dos nobres e dos servos 

Dos filósofos, e dos sábios indolentes 
Sinto pelo mundo e dele sua desgraça
Em meus pensamentos tão dolorosos 
Em meus ossos, ardentes na fumaça 
Sinto pelos enfermos e lastimosos 
Todos, absolutamente, entorpecidos 
E mais tolo é o que não se vê assim 
O filósofo que vaga, e o sábio 
O que creem na razão sem fim 

Pois enfim… 
Tenho pena dos sérios e dos astutos 
Que pensam da vida lograr a dor 
Tenho pena dos que não amam 
Dos que não morrem por amor.

Poemas de Arthur Gregório Valério, em destaque, na página 22, da 68a. Revista Ponto & Vírgula (julho/agosto/setembro/2024)


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