Ely Vieitez Lisboa



           Poema

Não fales nunca do amor
As palavras são frias diante do sentimento
Não faças poemas de amor
Todos os paradoxos já foram cantados
Quem amou conheceu infernos
Repetidas rotas rupestres ásperas
Não confesses ter experimentado o amor
Vivo estás, então o amor não era.
Jamais desejes o amor
Ele é falaz, vulpino animal
Coleios e venenos viperinos
Não vem se chamado
Se chega, régio presente grego
Lento veneno, arcabouço quimérico
Lianas de aço
Catálise.
Das contradições impossível falar
Das sensações de poder e falência
Grandeza e pequenez
Dos risos que afloram na alma
Do olor das angústias amargas
Tudo no coração semeia
Insensato joio no parco trigo.
Não fales do amor
Vive-o. Deixa que ele te devore
Em sarça ardente te transforme
Goza o fel, o veneno, o mel
Sem questionamentos, análises
Ama somente.
Tudo é danação e glória.

***


          Antissentimento


O amor não é bom
Ele quer o mal
Sente inveja e se envaidece
Da paz que se foi.
É jamais ganhar, só perder
Na dor, na dúvida, no medo
Da falácia, instável sensação
Da ânsia, do vazio, do oco
Da roubada alma.
É por vontade sonhar horizontes
E morrer sufocada entre montes
Grilhões do não saber
Quando ainda nem se viveu
E o fim já se delineou.
É servir, escravos os dois
Não há senhor / vencedor
Só nostalgia, amargura, a dor
Dos assinalados em desgraça.
Dos mortos na dúvida
Sufocamento sem fim
Porque o epílogo fatal
Prova sempre, efêmero, falaz
Que o amante sorve o veneno
Todavia não morre do mal.

***

           Poema


  É mal das mulheres, sempre sofrer em vão?
  É destino nosso perder o amor que, nas mãos pensamos ter?
  Ah, como tu vieste luz, sol, calor
  inundando todos os meus porões
  alijando do sótão tristeza e dor.
  Enriqueci-me como vinha nova
  cepa que recebe alento, vida
  da terra morna, alimento!
  Transbordei a alma em versos
   transformei lamentos em pura alegria
   porque te encontrara.
   Nunca pude te entregar os versos meus
    a vida roubou-me antes de ter dado
    levando contigo alegrias, roseirais e sonhos.
    Comigo ficou só a saudade do não tido
    o sabor do beijo jamais dado
    e todos os versos que te fiz
    que nunca por ti foram lidos.


***


      Diante de um mote de Santa Tereza de Jesus


        Por acaso pedi
que em minha vida entrasses
vento benéfico perfumando
o mais recôndito vazio
que purgatório já se habituara ser?
               Eu te permiti fazer de minhas mãos
conchas pejadas de pérolas, desejos novos
da carne adormecida
em casta hibernação?
Disse-te que podias fazer
de minha alma borboleta se antes crisálida fora
feia, embotada
casulo cinza de nenhum
jamais possível sonho novo?
Não te falei que perdera
todos os segredos dos cofres do sentimento?
E vieste assim, intempestivo
como um deus, como um homem
que conhece o chão jamais pisado.
Possuíste minha alma
feudo cerrado
e nela puseste teu selo
de dono remido.
Depois partes, te vais
sem culpa, remorsos, zelo
        pelo reino destruído?
       Nada entendo. A quem minha rebeldia?
       Só sei, no desalento derradeiro
       Que muero porque non muero!
                   






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