Segunda-feira de
trânsito caótico no centro de Ribeirão Preto, interior de São Paulo.
A pé, corro como
todas as outras pessoas. Sem entender a necessidade daquilo, vivendo uma
loucura escravizante, própria do homem pós-moderno. De repente, puxo meu freio
e penso alto, convicta:
- Não! Eu não sou
assim! Eu não tenho pressa. Escolho saborear o presente, sem desperdiçar minha
vida.
Foi o minuto em
que vi um jovem casal e uma criança. Os três de mãos dadas. Sorrisos em
sintonia. Simples. Eu posicionava-me do lado oposto da rua, aguardando o sinal
verde pra prosseguir mais lentamente agora.
A cena fisgou
minha atenção. O menino era a cara da mãe. O casal, cego. Ele de óculos
escuros, na mão direita uma bengala de metal. Ela, no auge dos aparentes 35,
cabelos longos, saia de cintura alta, esbelta. A expressão facial a
diferenciava de todos os deficientes visuais que eu já vira na vida. A criança,
de não mais que 10 anos, era o guia.
O semáforo
ofereceu-me passagem, conservei-me imóvel. Só pude seguir, cheia de sentimento,
a travessia dos três.
Aproximaram-se de
mim. Olhei para o garoto. Ele me sorriu um bom dia pleno de ternura. Quase
desmontei! Respondi ao cumprimento, e meu coração inflou-se de contentamento.
Agarrado no braço
da mãe, e esta no do pai, os três seguiram. Virei-me e, com o olhar, esperei
que dobrassem à direita na esquina seguinte.
Uma luz fulgurante
imitava aqueles passos. Era bonito de se ver. O menino falava, gesticulava,
cuidava para que os pais não tropeçassem. O casal ria em alto tom,
despreocupado.
Ao meu redor, os
transeuntes continuavam sua corrida contra o tempo. Aquele grandioso espetáculo
da vida passou despercebido. Lamentei. Diante de mim, uma cena emocionante. A
alegria daquelas pessoas simples era contagiante. E não eram simples pessoas.
Aguardando para
atravessar a rua, eu implorava o perdão divino, envergonhada por ora reclamar
de um grau e meio de miopia.
A inocência de
riso terno era dona de uma capacidade admirável de ser os olhos dos pais, além
dos próprios olhos. Dona da capacidade de ser humana, de ser solidária e,
indiscutivelmente, feliz.
Vivi instantes de
profunda reflexão. Minutos que me fizeram, naquela segunda-feira, pegar uma
agenda e rascunhar minha impressão, pouco tempo depois. Minutos que ficaram
eternizados aqui, dentro de mim.
Nossos olhos
precisam ver e enxergar. A beleza da vida está atravessando na nossa frente e
não estamos enxergando! Nossa alma e nosso coração estão cegos. A gente corre,
enlouquece, cansa... Quando chegar a hora de ir embora, talvez seja tarde pra
choro ou arrependimento.
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